A Harpa do Crente: Tentativas poeticas pelo auctor da Voz do Propheta

· Library of Alexandria
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Tibio o sol entre as nuvens do occidente Já lá se inclina ao mar. Grave e solemne Vai a hora da tarde!--O oeste passa Mudo nos troncos da lameda antiga, Que já borbulha á voz da primavera: O oeste passa mudo, e cruza a porta Ponteaguda do templo, edificado Por mãos rudes de avós, em monumento De uma herança de fé, que nos legaram, A nós seus netos, homens de alto esforço, Que nos rimos da herança, e que insultamos A cruz e o templo e a crença de outras eras: Nós, homens fortes, servos de tyrannos, Que sabemos tão bem rojar seus ferros Sem nos queixar, menospresando a Patria E a liberdade, e o combater por ella. Eu não!--eu rujo escravo; eu creio e espero No Deus das almas generosas, puras, E os despotas maldigo.--Entendimento Bronco, lançado em seculo fundido Na servidão de goso ataviada, Creio que Deus é Deus, e os homens livres!

Oh sim!--rude amador de antigos sonhos, Irei pedir aos tumulos dos velhos Religioso enthusiasmo, e canto novo Hei-de tecer, que os homens do futuro Entenderão:--um canto escarnecido Pelos filhos dest' épocha mesquinha, Em que vim peregrino a vêr o mundo, E chegar a meu termo, e repousar-me Depois á sombra de um cypreste amigo.

Passa o vento os do portico da Igreja Esculpidos umbraes: correndo as naves Sussurrou, sussurrou entre as columnas De gothico lavor: no orgam do coro Veio em fim murmurar e esvaecer-se. Mas porque sôa o vento?--Está deserto, Silencioso ainda o sacro templo: Nenhuma voz humana ainda recorda Os hymnos do Senhor. A natureza Foi a primeira em celebrar seu nome Neste dia de lucto e de saudade! Trévas da quarta feira eu vos saudo! Negras paredes, velhas testemunhas De todas essas orações de mágoa, Ou esperança, ou gratidão, ou sustos, Depositados ante vós nos dias De uma crença fervente, hoje enlutadas De mais escuro dó, eu vos saudo! A loucura da cruz não morreu toda Apoz dezoito seculos!--Quem chore Do sofrimento o Heróe existe ainda. Eu chorarei--que as lagrymas são do homem-- Pelo Amigo do povo, assassinado Por tyrannos, e hypocritas, e turbas Envilecidas, barbaras, e servas.

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