Quase duas décadas após ter sido defendida na Faculdade de Educação da USP, a tese de doutorado de Sueli Carneiro chega na forma de livro com grande atualidade. Nele, a autora aplica os conceitos de dispositivo e de biopoder de Michel Foucault ao domínio das relações raciais, forjando o que chama de dispositivo de racialidade — que produz uma dualidade entre positivo e negativo, tendo na cor da pele o fator de identificação do normal, representado pela brancura.
Especulando com Foucault e amparada na teoria do contrato racial do afro-jamaicano Charles Mills, ela demonstra como este dispositivo se constitui em um contrato que não é firmado entre todos, e sim entre brancos, e funda-se na cumplicidade em relação à subordinação social e na eliminação de pessoas negras. Ele também se efetiva pelo epistemicídio, cujo objetivo é inferiorizar o negro intelectualmente e anulá-lo como sujeito de conhecimento.
Contudo, todo dispositivo de poder produz a sua própria resistência, e é nesse contexto que a filósofa traz à obra a voz de quatro insurgentes. Seus testemunhos revelam que é da força da autoestima, da conquista da memória e da ação conjunta que se extrai a seiva da resistência.
SUELI CARNEIRO nasceu em 1950, na cidade de São Paulo. É escritora, ativista, filósofa e doutora em Educação pela USP. Cofundadora do Geledés – Instituto da Mulher Negra, tem vasta obra publicada, entre centenas de artigos, alguns deles reunidos nos livros Racismo, sexismo e desigualdade no Brasil (2011) e Escritos de uma vida (2019). Agraciada com diversos prêmios nacionais e internacionais, em 2022 recebeu o título de doutora honoris causa pela UnB.