"O pequeno pegureiro contou as cabras ร porta do curral; e, dando pela falta de uma, desatou a chorar com a maior boca e bulha que podia fazer. Era noite fechada. Tinha medo de voltar ao monte, porque se afirmava que a alma do defunto capitรฃo-mor andava penando na Agra da Cruz, onde aparecera o cadรกver de um estudante de Coimbra, muitos anos antes. O povo atribuรญra aquela morte ao capitรฃo-mor de Santo Aleixo de alรฉm-Tรขmega, por vinganรงa de ciรบmes, e propalava que a alma do homicida, de fraldas brancas e roรงagantes, infestava aquelas serras. O moleiro das Poldras contrariava a opiniรฃo pรบblica, asseverando que a avantesma nรฃo era alma, nem a tinha, porque era a รฉgua branca do vigรกrio. A maioria, porรฉm, pรดs em evidรชncia o facto psicolรณgico, divulgando que o moleiro era homem de maus costumes, tinha sido soldado na guerra do Rossilhรฃo, nรฃo se desobrigava anualmente no rol da igreja, nem constava que tivesse matado algum francรชs.
Era por 1813, meado de agosto, quando o pastor chorava encolhido, a um canto do curral, e pedia ao padre Santo Antรณnio com muitas lรกgrimas que lhe deparasse a cabra perdida."